11 junho 2009

Medo de dormir

"Meto os dedos no interior da massa negra do seu cabelo crespo e rebelde como toda a sua natureza, e desencanto os seus sorrisos ao compasso da música. Os mesu dedos são também pássaros entre folhagem de ébano profundo.
O meu pé busca o seu pé no meio deste oceano, em que se converteu a nossa cama. Uma cama em que não se fala; uma cama em que, sem outros trâmites, apenas se faz amor; uma cama em que o seu gelado silêncio e o seu formoso rosto, voltado para a parede, me transformam em náufrago. Num puro papel molhado. Num puro objecto à mercê do vaivém das marés.
(...)
Tenho medo de dormir. Medo do que possa suceder quando ultrapassar o véu que separa os dois mundos em que se converteu a minha vida.
Devagar, muito devagarinho, eu sumo-me na agonia da sua respiração. Quero entrar no seu "tempo", fundir-me com o seu arrítmico crepitar de toros húmidos que se negam a arder. Quem me dera dormir no seu sono para escapar do meu...
Fecho os olhos. Fecho os olhos. Fecho os olhos?"

María Elena Cruz Varela, A vingança de Joana d'Arc

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